Quando falta o discernimento, a família e a lei devem intervir para garantir a proteção do mais frágil.
Ela é a mulher mais rica do seu país, está com 88 anos e
decidiu fazer doações de dinheiro e obras de arte. Pronto. Não é
preciso mais nada para que gente de todo o tipo se aproxime e queira
levar vantagem. A mulher em questão é Liliane Bettencourt, a mais rica
da França, proprietária do grupo de cosméticos L’Oreal e dona de uma
fortuna avaliada em 15 bilhões de euros, algo em torno de 20 bilhões de
dólares. A idade avançada relativiza muita coisa na vida, e atos de
generosidade são comuns nessa fase. Daí o perigo. A filha da bilionária,
Françoise Bettencourt-Meyers, sabe disso. Há três anos vem tentando
evitar que a mãe continue a ser vítima de ambições alheias.
A preocupação faz sentido: entre as doações feitas, há uma de 1,4 bilhão de dólares para um fotógrafo e romancista. Pior, a filha suspeita que o administrador da fortuna da mãe, Pascal Wilhelm, é quem esteja
coordenando uma espécie de dilapidação do patrimônio.
Guardadas as devidas proporções, casos assim são comuns. Muita gente
dita “honesta” se vale da fragilidade de pessoas em condições especiais –
seja a idade avançada, uma doença física, emocional ou mental – e
consegue “tomar conta” da situação. Basta conseguir uma procuração. Por
meio dela, alguém que está ou se sente impedido de realizar algo –
chamado outorgante da procuração pelos termos jurídicos – vai até o
Cartório com seus documentos e declara ao escrevente que deseja nomear
alguém de sua confiança, que passa a ser o procurador. Esse procurador
ganha poderes de acordo com o estabelecido pela procuração, que pode ser
de amplos, gerais e ilimitados poderes tais como: ceder, transferir,
permutar, doar bens móveis ou imóveis. Ou específica para determinada
tarefa, como vender um carro ou uma casa. É simples assim!
Daí a preocupação de parentes de pessoas com alguma
incapacidade, seja temporária ou permanente. E como agir para evitar que
o pior aconteça? No caso da bilionária Liliane, sua filha está
conseguindo na Justiça que a mãe seja beneficiária de uma proteção dos
atos da vida civil. É o que comumente chamamos de interdição. Ou seja, a
pessoa é protegida da ação de gente inescrupulosa por meio da
interdição, prevista nos artigos 1767 e 1783 do Código Civil, que tratam
das questões de tutela e curatela – este último termo é utilizado na
linguagem jurídica como sinônimo de interdição. Esse recurso pode ser a
solução para situações em que, comprovadamente, a pessoa não pode mais
exercer livremente seus direitos e deveres.
Quem
pode pedir a interdição de alguém é seu cônjuge, pais, filhos ou outros
parentes. A primeira atitude é procurar um advogado para ingressar com o
pedido de ação de interdição. Para que esse processo seja iniciado,
certamente o juiz exigirá a constatação da incapacidade civil da pessoa
que se deseja interditar. Deverá ficar muito claro que ela não consegue
gerir sua própria vida. Para isso, o juiz se vale de especialistas,
utiliza instrumentos como laudos médicos e/ou psiquiátricos, ou ainda
relatórios de assistentes sociais e psicólogos especializados. Uma vez
constatada a incapacidade, inicia-se o processo de interdição. Dessa
forma, a partir do que for possível apurar, o juiz determinará o alcance
dessa interdição. Ela pode ser para todos os atos da vida civil ou
apenas para questões financeiras e/ou administrativas.
Se a causa que levou à interdição for transitória, depois de um
tempo o interditado pode pedir seu “levantamento”, ou cancelamento. O
juiz, então, pedirá exames de sanidade ou os que se relacionam ao caso.
Essa possibilidade é importante, principalmente quando o que causou a
interdição foram motivos como alcoolismo, dependência de drogas ou
impossibilidades físicas e/ou emocionais. Diante da recuperação
comprovada, ter seus direitos e deveres recobrados é fundamental para o
recomeço da vida. Ivone Zeger.
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